NATURALMENTE MÉRTOLA
Á história dos povos gravada nos escritos antigos, nas ruínas e artefactos postos a descoberto pela mão do homem, junta-se a história dos vales, planaltos e planícies que dão forma a um território que, pela sua singularidade e riqueza natural, é hoje classificado de Parque Natural do Vale do Guadiana.
O Parque Natural Vale do Guadiana pertence à Rede Nacional de Áreas Protegidas que o Instituto da Conservação da Natureza e das Florestas tem sob a sua alçada. Sobre o mesmo território foram ainda declaradas duas áreas classificadas no âmbito da Rede Natura: a Zona de Proteção Especial (ZPE) do “Vale do Guadiana” ZPE de Castro Verde; o Sítio “Guadiana” incluído na Lista Nacional de Sítios e Sítio Ramsar para a Ribeira do Vascão.
PAISAGEM
A paisagem do parque na envolvente ao rio Guadiana apresenta, vales escarpados com fragas e matagais mediterrâneos arborescentes de zimbro Juniperus turbinata ssp. turbinata e bosques de azinheira Quercus rotundifolia. Estas manchas de vegetação original encontram-se restringidas às zonas mais inacessíveis, ao longo dos vales das principais linhas de água, onde a intervenção humana pouco se faz sentir.
Ribeira do Vascão
Nos cursos de água afluentes ao rio Guadiana desenvolve-se uma vegetação ribeirinha diversificada, onde se destaca o loendro Nerium oleander, tamujo Securinega tinctoria ou Flueggea tinctoria e a tamargueira Tamarix africana. Caminhando para zonas onde o leito de água corre mais largo, a vegetação altera-se, encontrando-se cortinas ripícolas de salgueiros Salix spp. e freixos Fraxinus spp. Estes corredores ripícolas têm uma função importante na consolidação das margens e na diminuição da erosão das águas torrenciais sobre o solo marginal. As ribeiras do Parque Natural, entroncadas entre o relevo acentuado, apresentam grandes variações do seu caudal, sofrendo de um profundo défice hídrico durante os meses de verão. Nesta altura, a água resume-se aos pegos, dispersos ao longo do troço da ribeira. Os pegos são o último reduto de água doce de muitas espécies de fauna, principalmente importantes para a fauna piscícola.
No Parque Natural Vale do Guadiana ocorrem vastas áreas de charneca arbustiva que são constituídas por plantas adaptadas ao elevado índice de secura que é característico da região. Após o abandono da exploração agrícola extensiva, as terras são colonizadas por espécies arbustivas pioneiras, como são o caso da esteva Cistus ladanifer, do sargaço Cistus monspeliensis, da roselha Cistus crispus, do sargoaço Cistus salvifolius, do rosmaninho Lavandula stoechas e do tojo-molar Genista triacanthos, garantindo, mais tarde, a fixação e desenvolvimento de espécies arbóreas. Apesar de não ser dominante, na paisagem do Parque, ocorrem algumas áreas de montado, predominantemente de azinho Quercus rotundifolia, uma vez que o sobreiro é menos resistente a elevadas amplitudes térmicas e à secura estival, características climatéricas desta zona.
São também frequentes as áreas de planície onde se pratica uma agricultura cerealífera extensiva. A paisagem é ainda marcada pelas elevações das Serras de Alcaria e S. Barão.
FAUNA
Casal de francelhos Falco naumanni, com o macho à esquerda (® Carlos Carrapato).
Esta é uma importante área para aves rupícolas, com destaque para a águia imperial Aquila adalberti, a águia-real Aquila chrysaetos, a águia de Bonelli Hieraaetus fasciatus, o bufo-real Bubo bubo ou o grifo Gyps fulvus; mas é igualmente referenciada pelas aves estepárias como a abetarda Otis tarda, o sisão Tetrax tetrax ou o cortiçol-de-barriga-preta Pterocles orientalis. Destaque, na vila de Mértola, para a única colónia de peneireiro-das-torres Falco naumanni que no país ainda persiste em meio urbano. O concelho alberga 18% da população nacional de Peneireiro-das-torres. O andorinhão-cafre Apus caffe, espécie do norte de África, é uma presença regular na zona da Mina de S. Domingos.
A área geográfica do Parque Natural é fortemente marcada pela presença do rio Guadiana e dos seus afluentes. A fauna piscícola é extremamente variada, existindo 15 espécies de peixes autóctones e migradores, dos quais dez são endemismos ibéricos, estando, em Portugal, três restringidos à bacia hidrográfica do Guadiana: saramugo Anaecypris hispanica, boga do Guadiana Pseudochondrostoma willkommii, barbo-de-cabeça-pequena Barbus microcephalus. Quanto aos peixes migradores, destaca-se a lampreia Petromyzon marinus e a saboga Alosa fallax, enquanto que o sável Alosa alosa está em perigo de extinção.
De entre as várias ribeiras afluentes do Guadiana, destaque para a ribeira do Vascão que, dada a qualidade das suas águas e presença de elevados valores naturais em matéria de ocorrência de espécies piscícolas da Bacia do Guadiana, conseguiu, em 2013 a classificação enquanto Sitio Ramsar.
Dentro do grupo dos anfíbios, das 17 espécies que ocorrem em Portugal, pelo menos 13 podem ser observadas na área do Parque, destacando-se pela sua raridade e/ou importância das populações a rã-de-focinho-pontiagudo Discoglossus galganoi, o sapo-parteiro-ibérico Alytes cisternasii e o tritão-de-ventre-laranja Triturus boscai.
No grupo dos répteis, estão referenciadas pelo menos 20 espécies, sendo de evidenciar a cobra-de-pernas-pentadáctila Chalcides bedriagai espécie rara e que se restringe à Península Ibérica e a cobra-de-água-de-colar Natrix natrix, de hábitos crepusculares e ainda pouco conhecida.
Na região pode-se ainda observar duas espécies de cágados, uma delas bastante rara no contexto nacional – o cágado-de-carapaça-estriada Emys orbicularis. De registar ainda a ocorrência de uma espécie de osga invulgar, a osga-turca Hemidactylus turcicus.
Na área do parque natural estão inventariados 35 espécies de mamíferos, entre eles contam-se a lontra Lutra lutra, o gato-bravo Felis silvestris e o leirão Elyomis quercinus. Entre as fendas rochosas dos vales das ribeiras e nas antigas minas refugiam-se várias espécies de morcegos, como o morcego-de-ferradura-mourisco Rhinolophus mehelyi, morcego-rato-grande Myotis myotis, morcego-de-ferradura-grande Rhinolophus ferrumequinum ou o morcego-hortelão Eptesicus isabellinus.
A descrição dos valores naturais da área do Parque finaliza destacar ainda algumas espécies de borboletas: Almirante-vermelho Vanessa atalanta; Bela-dama Vanessa cardui; Borboleta-zebra Iphiclides feisthamelli; Borboleta-cauda-de-andorinha Papilio machaon.
FLORA
A paisagem do Parque Natural é marcada por uma flora tipicamente mediterrânica. As espécies mais comuns são o loendro Nerium oleander, a tamargueira Tamarix africana, o tamujo Myrsine retusa que se encontram ao longo das linhas de água e as estevas Cistus ladanifer que cobrem as terras outrora lavradas. As encostas de grande declive estão cobertas por matagais de zimbros Juniperus communis, espécie importante para conservação. A flora da área do Parque Natural é também bastante rica em plantas aromáticas e medicinais, como o rosmaninho Lavandula stoechas, o alecrim Rosmarinus officinalis, a erva-ursa Thymus mastichina, a murta Myrtus communis, e o poejo Mentha pulegium. Entre as raridades e espécies ameaçadas da flora, há a destacar o trevo- peludo de-quatro-folhas Marsilea batardae que ocorre nas zonas ribeirinhas, os narcisos Narcisus fernandesii e várias espécies de orquídeas como a flor-abelha Ophrys tenthredinifera, a neotínea-malhada Neotinea maculata, a serapião-de-língua-pequena Serapia parviflora, ou a testículo-de-cão Orchys morio ssp champagneuxii.
Na zona da Mina de S. Domingos o destaque vai para a Erica Andevalensis, uma planta endémica da Faixa Piritosa Ibérica que, apenas está identificada na área mineira de São Domingos em Portugal e Rio Tinto em Espanha.
Fonte:ICNF
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